Poemas de usuários da oficina Literatura do Corpo, dos Centros de Convivência Providência e Venda Nova
O trabalho da escrita e a voz dos usuários foram se consolidando no espaço e no cotidiano dos Centros de Convivência
Desde quando teve inicio o exercício criativo com a palavra como foram relatados acima, e por esses horizontes fecundos de invenção, tendo como eixo estrutural a palavra, podemos dizer seminal para o despertar, o surgimento e a sistematização de uma produção estética produzida em conjunto por essa clientela, na qual procurei estabelecer uma conexão de linguagens e um sistema de signos como recurso de desenvolvimento da expressão e estratégia de inserção social.
Portanto, mediante essa experiência, me dispus a realizar uma imersão na memória com o intuito de narrar nessa reflexão os modus operandi, os desafios metodológicos, as dúvidas vividas e, sobretudo, os caminhos de criação e, ainda, o exercício de experimentação estabelecido dentro do dispositivo de saúde mental. No sentido de constituir um conjunto de atividades na perspectiva de oferecer uma oficina de criação, numa visão ampliada que ajudasse no processo de desenvolvimento pessoal e possibilitasse o acesso à cultura, Dessa maneira, gradualmente, a iniciativa foi tomando um formato e compreensão consistente.
Por outro lado, fui dando sequência ao projeto que batizei de Literatura do Corpo, e assim abri um espaço de investigação com a palavra e outros signos de linguagens, estabelecendo um canal aberto com o universo da literatura e expansão imagética junto a essa clientela atendida no serviço substitutivo. Desse modo, com o passar do tempo e a seriedade como foi encarado esse empreendimento, ao seguir os primeiros passos, que exigiram risco e responsabilidade, mas que com o êxito foi atraindo outros participantes para essa atividade criativa num híbrido entre corpo e palavra.
Consequentemente, tempos depois, ampliei essa atividade para outro dispositivo, comecei a desenvolver a mesma oficina no Centro de Convivência Venda Nova. No entanto, dando um aspecto mais de performance com a produção de textos e leituras em voz alta, na tentativa de estimular a fala, a escrita criativa e intervenções com poesia. Posto isso, foi sendo investido um tempo maior nessa prática de criação, que foi exigindo mais investimento de várias formas, como de materiais de pesquisa, livros, revistas, vídeos e CDs para as atividades desenvolvidas e ampliação da oficina, bem como um investimento maior de tempo para sua realização, culminando uma produção relevante e diversificada.
Aproveito e destaco os textos produzidos pelos participantes envolvidos nos dois dispositivos que também podem ser conferidos no site que compões esse livro, que registra e cataloga a produção em poesia visual, vídeos e músicas, sons e depoimentos. Os textos aqui em disposição revelam a subjetividade e a visão de mundo dos usuários tanto no aspecto estético, como em sua perspectiva de sintomas, mas sem deixar de revelar a beleza e a complexidade das questões vinculadas à dimensão humana. São textos que transbordam, no sentido do fazer poético e da feitura da escrita, sendo assim, trazem em seu íntimo uma potência de humanidade, sobretudo verdades doloridas em cada voz poética que se permite ser escrita. Por outro lado, são vozes criativas que às vezes se confundem com delírio e alto grau de criação no aspecto profundo da invenção com a palavra interligada ao universo da loucura. Cada gesto poético escrito no campo do sentido carrega muitas vozes em sua escrita, que denotam um canto cheio de cicatrizes, lembranças e uma esperança motivada pela intenção, liberados por esses impulsos, pulsões… por meio da palavra e da caneta.
Eis aqui, para a leitura e contemplação, o universo sensível e imagético dos usuários que vivenciaram e experimentaram com urgência a literatura de si.